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Avaliação Pré-operatória de Vias Aéreas por Ultrassonografia em Portador da Síndrome DiGeorge

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Avaliação Pré-operatória de Vias Aéreas por Ultrassonografia em Portador da Síndrome DiGeorge

Bruno Romualdo e Silva1

Gisèle Passos da Costa Gribel2

Benjamin Zylberberg3

Juliane Rodrigues Solis Correa1

Aluno da Pós-graduação Lato sensu em Anestesiologia do Hospital Central do Exército 1

Mestre em Ciências Médicas. Coordenadora da da Pós-graduação Lato sensu em Anestesiologia do Hospital Central do Exército.Chefe do Centro de Ensino e Treinamento em Anestesiologia do Hospital Central do Exército2

Professor da Pós-graduação Lato sensu em Anestesiologia do Hospital Central do Exército. Instrutor do Centro de Ensino e Treinamento em Anestesiologia do Hospital Central do Exército3

Bruno Romualdo e Silva

Serviço de Anestesiologia do Hospital Central do Exército

Rua Francisco Manoel, 126 - Benfica, Rio de Janeiro - RJ, 20911-270

 e-mail: Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.

Fontes de financiamento: não há

Número total de páginas do artigo: 8

Número de figuras: 1

Resumo

Introdução: A Síndrome DiGeorge é uma síndrome genética associada com uma deleção do cromossoma 22q11.2 A incidência é de 1/4000 afetando igualmente ambos os sexos. Manifesta-se clinicamente com micrognatia, doença cardíaca congênita, hipocalcemia, paratiroidite e imunodeficiência celular por anomalias no timo. Quando presentes, o refluxo gastroesofágico, alteração de motilidade faríngea e esofagiana, além de anomalias de face ou do palato e encurtamento de traquéia podem dificultar a abordagem da via aérea. Pneumonia por aspiração é a principal complicação peri-operatória relacionada.

Objetivo: Este relato de caso de um paciente portador da Síndrome DiGeorge  discute o manuseio anestésico frente as complicações clínicas que o paciente apresenta em especial as dificuldades na abordagem da via aérea durante a anestesia geral.

Descrição do Caso: Lactente, 7 meses, masculino, portador de refluxo gastresofágico internado para implantação de uma gastrostomia portador da Síndrome DiGeorge. Apresentava cardiopatia já submetida a tratamento cirúrgico. Foi submetido à anestesia geral venosa após realização de ultrassonografia de vias aéreas previamente à anestesia evidenciando integridade do palato e véu palatino. Intubado na segunda tentativa com sucesso confirmado pela ultrassonografia de vias aéreas. Porém necessitando de reposicionamento endobrônquica. O paciente foi encaminhado extubado ao Centro de Terapia Intensiva, acordado.

Conclusão: Os anestesiologistas mediante tais fatores que predispõem a um evento adverso de difícil ventilação e intubação, devem avaliar,  preliminarmente as vias aéreas  antes por exame clínico e exame de imagens, como a realização de Ultrassonografia  de vias aéreas prévia descrita estudos anteriores.

Palavras-chave: Anestesia; Criança; Síndrome DiGeorge; vias aéreas

Summary Introduction: DiGeorge Syndrome is a genetic syndrome associated with a deletion of chromosome 22q11.2 The incidence is 1/4000 equally affecting both sexes. It manifests clinically with micrognathia, congenital heart disease, hypocalcemia, parathyroiditis and cellular immunodeficiency due to anomalies in the thymus. When present, gastroesophageal reflux, pharyngeal and esophageal motility disorders, facial or palate anomalies and shortening of the trachea may make it difficult to approach the airway. Aspiration pneumonia is the main related peri-operative complication.

Objective: This case report of a patient with DiGeorge Syndrome intends to discuss the anesthetic handling in front of the clinical complications that the patient presents in particular the difficulties in approaching the airway during general anesthesia.

Case report: Infant, 7 months, male, with gastroesophageal reflux hospitalized for implantation of a gastrostomy carrier of the DiGeorge Syndrome. He presented cardiopathy already submitted to surgical treatment. It was submitted to general venous anesthesia after performing airway ultrasound prior to anesthesia evidencing palatal integrity and palatine veil. Intubated on the second attempt with confirmed success by airway ultrasonography. However, it requires endobronchial repositioning. The patient was referred extubated to the Intensive Care Unite, conscious.

Conclusion: Anesthesiologists, by such factors predisposing to an adverse event of difficult ventilation and intubation, should preliminarily assess the airways before by clinical examination and imaging examination, such as performing aerial ultrasonography prior described earlier studies.

Keywords: Anesthesia; Child; DiGeorge syndrome; Airways

Introdução:

Síndrome DiGeorge uma síndrome genética associada com uma deleção do cromossoma 22q11.2 A incidência é de 1/4000 afetando igualmente ambos os sexos. A Síndrome pode ter maior frequência em virtude da variabilidade de expressão. A mortalidade ocorre em torno de 4%. É a segunda maior causa de atraso de desenvolvimento e apenas superada pela Síndrome de Down como causa de cardiopatia congênita.  Manifesta-se clinicamente com micrognatia, doença cardíaca congênita, hipocalcemia, paratiroidite e imunodeficiência celular por anomalias no timo (1). Quando presentes, o refluxo gastroesofágico, a alteração de motilidade faríngea e esofagiana, anomalias de face e do palato e encurtamento de traquéia, podem dificultar a abordagem da via aérea. Pneumonia por aspiração é a principal complicação peri-operatória relacionada (2)

Relato de caso:

Lactente, 7 meses, masculino, portador de refluxo gastresofágico internado para implantação de uma gastrostomia.

Durante a avaliação pré-anestésica foi informado pelos genitores a história patológica pregressa; que havia nascido em casa de parto, a termo, pesando 2950g.

Foi diagnosticado então com cardiopatia (atresia pulmonar, comunicação interventricular, permanência de canal arterial e comunicação interatrial. Já havia sido submetido à 3 intervenções cardíacas:  realizado na primeira o shunt tipo Blalock (entre tronco braquiocefálico e artéria pulmonar D), na segunda intervenção a dissecção e bandagem do shunt, sendo observada ausência de timo. Por último procedeu-se à correção de operação de Rastelli para reconstrução da saída do ventrículo direito após um cateterismo. Diagnosticado aos 3 meses de vida como portador da Síndrome de DiGeorge e confirmado por cariótipo de FISH.

Ainda na avaliação pré-anestésica, os exames pré-operatórios para a cirurgia de gastrostomia demonstravam: Paratormônio de 8,6 pg/mL; Uréia de 24 mg/dL; Creatinia de 0,33 mg/dL; Cálcio de 8,95 mg/dL; Fósforo de 7,81 mg/dL; TGO de 88 UI/L; TGP de 109 UI/L; Fosfatase Alcalina de 1740 UI/L e Gama-GT de 1384 UI/L.

 

FIGURA 1 – Imagem de USG, corte supra-hióide demonstrando palato íntegro

No dia da cirurgia, ao chegar à sala de operação, procedeu-se à monitorização com com eletrocardiografia, oxímetria de pulso, pressão arterial não invasiva e capnografia.  Foi submetido à anestesia geral venosa após realização de ultrassonografia de vias aéreas previamente à anestesia evidenciando integridade do palato e véu palatino (Figura 1). Não foram visualizadas massas ou outras alterações maiores nas vias aéreas. Indução feita por veia periférica calibre 24 com Midazolam e Fentanil e mantida com Cetamina, Fentanil e Midazolam em doses fracionadas. Primeira tentativa de IOT (lâmina de Muller n 0 e tubo traqueal número 4 sem cuff) falha (intubação esofágica). Segunda tentativa de IOT (lâmina de Muller n 01 e tubo número 4 sem cuff) com sucesso confirmado pela ultrassonografia de vias aéreas, porém necessitando de reposicionamento (endobrônquica). Realizada administração de dipirona 160 mg e cefalotina 160 mg endovenoso. O paciente foi encaminhado extubado ao Centro de Terapia Intensiva e acordado.

Discussão:

A síndrome DiGeorge é acompanhada de diversas alterações morfológicas que frequentemente leva os seus portadores a intervenções cirúrgicos ao longo de sua vida.  Uma vez que ocorrem em faixas etárias específicas, os achados clínicos sugestivos da síndrome variam e ao menos dois deles devem ser identificados para se realizar os estudos cromossômicos necessários: atraso no desenvolvimento e no aprendizado, alterações psiquiátricas ou comportamentais, malformação palatina, imunodeficiências (2%), hipocalcemia (60%).

 Entre as alterações otorrinolaringológicas (50%), ocorrem dismorfismo da face (orelhas protuberantes, fronte pequena, pálpebras caídas, achatamento malar e asas do nariz hipoplásicas e malformação palatina. As alterações   cardiovasculares ocorrem em 75% dos casos e 30 a 40% necessitam de correção cirúrgica.

Frequentemente ocorrem Tetralogia de Fallot, defeitos septais, atresia pulmonar entre outros.

 As alterações gastrointestinais variam de refluxo gastroesofágico, constipação colelitíase, hérnias, até a alterações da motilidade como disfagia em 35% 

 As alterações do pálato ocorrem em 75% dos casos e compreendem regurgitação nasal, voz anasalada, insuficiência de véu palatino ou fenda. A avaliação do palato é recomendada até o quino ano de vida (1). Outras alterações morfológicas do aparelho respiratório podem ocorrer incluindo encurtamento da traquéia. Este achado aumenta a chance de intubação seletiva que ocorreu neste relato (2,8).

 As alterações morfológicas extra cardíacas aumentam a morbidade e mortalidade perioperatória (3).

 O cálcio sérico deve ser corrigido previamente à cirurgia. Hiperventilação e utilização de hemoderivados contendo citrato pioram a hipocalcemia podendo acarretar convulsões.

 Outras síndromes apresentam também deformidade do palato como Pierre Robin, Apert, Crouzon e Treacher Collins. Além disso, fatores ambientais aumentam a incidência desta alteração como fumo, álcool, isotrenitoína, deficiência de ácido fólico e cobalaminas (4). Vários relatos de aspiração foram descritos em pacientes portadores desta síndrome inclusive no perioperatório. Este evento foi relacionado as alterações de motilidade esofágica e refluxo gastroesofágico assim como as alterações de faringe e laringe nos portadores (2,5).

As alterações imunológicas aumentam o risco de infecções por aspiração. Todo o cuidado com a assepsia devem ser tomados assim como a antibioticoprofilaxia adequada.

A avaliação detalhada das vias aéreas nos pacientes portadores da síndrome Di George submetidos à anestesia ou sedação é recomedada (6). Além da possibilidade de via aérea difícil, somam-se as dificuldades de ventilação, problemas circulatórios e neurológicos. Recomenda-se cautela no uso de bloqueadores neuromusculares principalmente os despolarizantes (7). A avaliação ultrassonográfica das vias aéreas amplia a segurança do manuseio das vias aéreas nestes pacientes principalmente por detectar com rapidez, segurança e de forma eficaz alterações da anatomia das vias aéreas, não só no em situações cirúrgicas, mas também no departamento de unidade de terapia intensiva e emergência. Suas aplicações clínicas incluem a identificação da localização do tubo endotraqueal ou máscara laríngea, orientação para traqueostomia percutânea e cricotireoidotomia, detecção de estenose subglótica, previsão de intubação difícil, especialmente em pacientes obesos, e estridor pós-extubação e especialmente neste caso previsão do tamanho do tubo endotraqueal pediátrico e de tubo de duplo-lúmen. Além disso, pode ser usado para facilitar a anestesia regional das vias aéreas superiores a fim de se realizar uma intubação com o paciente acordado. Finalmente, a ultrassonografia de vias aéreas também auxilia no diagnóstico de patologias das vias aéreas superiores, como as inflamatórias (sinusites, epiglotites etc), bem como as malformações de palato, orofaringe e assoalho da boca (8,9).

 Conclusão:

Os anestesiologistas mediante tais fatores que predispõem a um evento adverso de difícil ventilação e intubação devem avaliar preliminarmente as vias aéreas  antes de realizar a indução  anestésica; por exame clínico e exame de imagens, como a realização de USG de vias aéreas prévia descrita estudos anteriores.

 Bibliografia:

 (1) Bassett AS, McDonald-McGinn DM, Devriendt K et al. Practical Guidelines for Managing Patients with 22q11.2 Deletion Syndrome. The J Pediatric, 2011;159: 332-9.

(2) Lee JI, Han YJ - Aspiration pneumonia in the child with DiGeorge syndrome, a case report. Korean J Anesthesiol, 2011; 60:449-52.

(3)Yeoh TYScavonetto FHamlin RJBurkhart HM et al - Perioperative management of patients with DiGeorge syndrome undergoing cardiac surgery, 2014;28:995-1001.

(4) Kohli SS, Kohli VS - A comprehensive review of the genetic basis of cleft lip and palate. J Oral Maxillofac Pathol, 2012; 16: 64-72.

 (5) Chegar BE, Tatum AS 3rd, Maarrinan E et al - Upper airway asymmetry in velo-cardio-facial syndrome. Int J Pediatr Otorhinolaryngol, 2006; 70:1375-81.

(6) Marom T, Hoth Y, Goldfarb A - Head and neck manifestations of 22q11.2 deletion syndromes. Eur Arch Otorhinolaryngol, 2012; 269:381-7.

 (7) Butler MG, Hayes BG, Hathaway MM et al - Specific Genetic Diseases at Risk for Sedation/Anesthesia Complications. Anesth Analg, 2000; 91:837–45.

 (8) Wells AL, Wells TR, Landing BH et al -  Short trachea, a hazard in traqueal intubation of neonates and infants syndromal associations. Anesthesiology, 1989; 71:367-73.

 (9) Kundra P, Mishra SK, RameshA - Ultrasound of the airway. Indian J Anaesth, 2011; 55:456-62.

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